Receber ou fazer ligação durante o voo é quase sempre proibido
Mesmo com o Wi-fi a bordo se generalizando, o cenário de dezenas de celulares tocando num avião lotado de gente falando alto ainda não aconteceu. Mas poderia muito bem acontecer daqui há um ou dois anos já que os avanços tecnológicos permitam a qualquer celular de receber ligações se o avião tiver os equipamentos necessários, e algumas companhias já autorizam as ligações em rotas especificas. Mas, na imensa maioria dos voos internacionais, as conversas telefónicas são proibidas por quatro tipos de razões distintas: os riscos técnicos, a oposição dos tripulantes, as dúvidas dos passageiros, e a legislação restritiva.
A longa história das ligações telefônicas a bordo
O possível impacto das ligações telefónicas sobre a segurança dos voos tem uma longa historia. Nos anos 90 era autorizadas desde um telefono fixo instalado perto dos galleys, nos anos 2000 foi um aparelho encaixado na sua frente onde era possível falar depois de passar um cartão de credito. Com a sofisticação crescente dos celulares, os temores de interferências com os equipamentos do cockpit levaram nos anos seguintes os especialistas a uma proibição total. Hoje as pesquisas nunca comprovaram esses riscos, os fabricantes garantem o risco zero para os novos aparelhos, e a segurança eletrônica não deveria mais ser um motivo de impedir as ligações.
A oposição dos tripulantes é extremamente firme. Eles acham que a liberação das chamadas telefônicas poderia levar ao caos nas cabinas, que brigas as vezes incontroláveis vão acontecer entre passageiros falando alto no telefone e outros querendo tranquilidade. Já gerenciando poltronas reclináveis, excessos de bebidas, luzes noturnas e choros de bebês, as aeromoças e os comissários não querem ser obrigados a interferir em novos conflitos de comportamento. Alguns sindicatos profissionais levantaram também problemas de segurança pela falta de atenção dada as instruções dos tripulantes pelos passageiros grudados aos seus telefones.
Altos executivos são os mais favoraveis ao uso do celular no avião
Os viajantes e os profissionais do turismo estão divididos sobre essa liberação. Varias pesquisas mostraram que a maioria dos passageiros estão se opondo a um “liberou geral”. Eles temem que os toques das chamadas e as conversas a voz alta levam a uma cacofonia geral, e que discussões sobre níveis de som geram atritos e até brigas. Essas pesquisas mostraram também que menos de 5% dos viajantes acham interessantes poder utilizar os seus celulares durante os voos. Mas esses encontram-se principalmente entre os homens de negócios e os passageiros da classe executiva que as companhias aéreas vão, com certeza, escutar com muita atenção.
A proibição de uso dos celulares ainda é a regra geral
Mesmo se não é internacionalmente proibido de receber ou fazer ligações a bordo, essa proibição existe de fato ou de direito em muitos países. É o caso dos Estados Unidos onde existam não somente restrições da Federal Communications Agency sobre o uso das duas bandas mais utilizadas pelos celulares, mas também uma regra da Federal Aviation Administration proibindo as conversas por celular nos voos comerciais. No Brasil a ANAC exige que os celulares estejam em modo avião durante o voo. Sem proibir as conversas via aplicativo, pede com bom senso que os tripulantes vigiam “formas incômodas ou inseguras de uso dos celulares como utilização dos alto-falantes ao invés de fones de ouvido, e as comunicações em voz alta”.
O celular nos trens já virou hábito de todos sem gerar conflito!
Os especialistas prevêem que as agencias reguladoras liberarão o uso de celulares nos aviões, deixando as companhias aéreas decidir tanto as possibilidades como as condições de uso. Para evitar os caos sonoros e os conflitos, uma das soluções será talvez de copiar o modelo escolhido por varias companhias de trem que abriram espaços específicos para os passageiros querendo fazer ligações em voz alta. E a longo prazo, é bom lembrar que os millennials e as novas gerações quase não falam mais diretamente no celular mas deixam mensagens. O bom senso e os novos hábitos de consumo terão evitado uma guerra.
A imagem do Presidente impacta a imagem do pais e do destino
As últimas eleições americanas, e a acirrada disputa que acabou com a vitória de Joe Biden, foram seguidas com muita atenção – e as vezes com muita paixão – pelos profissionais do turismo do mundo inteiro. Agentes de viagem ou hoteleiros sabem que as futuros decisões dos responsáveis políticos impactam de forma decisiva as escolhas dos viajantes. Com rumos diferentes dados pelos governos ao crescimento econômico, aos índices da bolsa, ao valor de câmbio, as infraestruturas, bem como a imagem do país e de seu “comandante-em-chefe”, os fluxos de turistas podem aumentar, diminuir ou simplesmente mudar de destinos.
O dinamismo de Wall Street impacta diretamente as viagens dos americanos
Se olhar por exemplo os fluxos de turistas norte americanos para Europa nos últimos trinta anos, pode observar que dois desses fatores explicam as flutuações do número de viajantes. O valor do câmbio do USD frente as moedas européias e depois para o EUR, combinado com o nível do índice da bolsa de Nova Iorque, definem assim claramente as evoluções anuais, baixando até menos de 10 milhões quando for desfavoráveis como em 2003 ou 2008, e subindo até um teto de 18 milhões quando a força do USD se junta com o otimismo de Wall Street, o que foi o caso em 2000, 2007 ou 2018.
Obama se empolgou pela promoção do turismo nos EEUU
Além das suas decisões e dos seus sucessos, os dirigentes democratas ou republicanos influenciam as viagens com sua própria imagem. Olhando a dura concorrência da Europa e dos Estados Unidos para o primeiro lugar dos seus destinos junto aos viajantes brasileiras, é assim interessante de ver como os brasileiros votaram com as suas viagens. Atrás da Europa no início dos anos 90, os Estados Unidos passaram na frente durante a cia do Clinton. A liderança se inverteu na presidência do Bush, até que a chegada do Obama voltou a por os Estados Unidos no primeiro lugar, posição que eles perderam depois da eleição do Trump. Os jogos estão agora abertos para 2021….
As escolhas politicas americanas impactam os destinos europeus
Uma pesquisa realizada alguns anos atrás pela Atout France nos Estados Unidos mostrou que a própria escolha dos destinos depende também dos perfis políticos dos viajantes. 78% dos entrevistados declaravam que suas convicções partidárias influenciavam as suas viagens. Dos quatro grandes destinos europeus dos estadunidenses, a Inglaterra era “vermelha” (preferida por 87% dos republicanos e somente 18% dos democratas) assim como, em menor escala, a Alemanha (24% dos republicanos e 18% dos democratas), enquanto a França e a Itália eram azuis de forma arrasadora (respectivamente 8% republicana e 73% democrata para a primeira, 14% republicana e 57% democrata para a segunda). Será que viagem é mesmo também politica?
O filme “O dia mais longo” foi decisivo para popularizar o Dia D
Antes mesmo de começar a ser comemorado, a vitoriosa batalha do Dia D sempre foi um assunto de muitas polémicas, de aliados que reclamaram da demora, de militares que questionavam a necessidade de uma nova frente independente da batalha da Itália, ou da Resistência francesa que desconfiava da vontade de Roosevelt de submeter a França a uma ocupação militar americana. As comemorações sempre foram discretas até os anos 60, quando o fabuloso filme do realizador Darryl F. Zanuck , a força das associações de veteranos americanos, inglesas e francesas, bem como o apoio do governo francês (mesmo se o proprio de Gaulle se recusou a participar) levaram ao sucesso do vigésimo aniversario.
O famoso paraquedista de Sainte Mere l Eglise
A partir dos anos 70, o turismo de memória não parou de crescer em toda essa região da Normandia. São hoje mais de 5 milhões de turistas que visitam as lendárias praias de Omaha Beach (a mais famosa, sendo as outras Utah Beach, Gold Beach, Juno Beach e Sword Beach), o porto de Arromanches, a aldeia de Sainte Mère l’Église, o Memorial de Caen, ou um dos 94 lugares históricos onde se desenrolou a batalha. E mesmo se fazem questão de lembrar as dramáticas 30.000 mortes de civís nos bombardeios alemães ou americanos, os moradores estão hoje orgulhosos de lembrar essa pagina gloriosa aos visitantes vindo da França (50%), do Reino Unido (10%), dos Estados Unidos (8%) e até da Alemanha (5%).
Um novo projeto está agora reativando as polémicas. O Presidente da Normandia anunciou em janeiro desse ano o lançamento do espetáculo “Homenagem aos heróis”, com o objetivo de perenizar as comemorações e de atrair 600.000 visitantes a mais nos hotéis, restaurantes e museus da região. Com uma tecnologia inédita, um roteiro escrito por três produtores franceses e canadenses, um prestigioso comité científico e um comité de ética incluindo veteranos de guerra, o espetáculo deve ser pronto para as comemorações dos 80 anos do Dia D. Os investidores garantem que já asseguram os 50 milhões de euros de financiamento, e que dois municípios da área, Bayeux e Carentan, já ofereceram os 30 hectares necessários.
Macron e Trump nas comemoracões dos 75 anos do D Day
Mesmo sem ter os detalhes do projeto, as criticas foram imediata contra o que os opositores já estão chamando de D-Daylandia. Um comité de preservação do património local já mandou um abaixo assinado para o Presidente em nome da ética, da memória e do meio ambiente. Um advogado depositou um recurso alegando a proximidade do cemitérios militares, e a Associação dos veteranos da quarta divisão de infantaria americana mandou uma carta aberta se opondo, “em nome dos sacrifícios dos heróis caídos na batalha a qualquer decisão que tocasse essa terra sagrada”. Entendendo a emoção dos moradores, os responsáveis lembraram que o projeto, alem da sua importância para economia regional, é também uma perenização da memória.
O Memorial de Caen
Com um roteiro ainda para ser escrito, o projeto “Homenagem aos heróis” será um documentário vivo de uma hora de duração. As arquibancadas serão montadas em cima de trilhos, um longo travelling de 800 metros durante o qual serão apresentados dez quadros misturando imagens, documentários, artistas benévolos e profissionais. Aproveitando a experiencia bem sucedida do Memorial de Caen – que atrai 400.000 pessoas por ano a proximidade das praias do Dia D-, os organizadores querem atingir um público jovem e sem ligação direto com a segunda guerra, não somente para trazer um melhor conhecimento dessa batalha decisivo para a liberdade do mundo, mas também para transmitir as novas gerações a emoção dos dias terríveis vividos pelos combatentes e os moradores de junho a setembro 1944.
A imprensa internacional não poupou o vencedor da eleição presidencial
Lendo as grandes mídias internacionais, do New York Times a El Pais ou do Haaretz ao Le Monde, uma onda de reprovação contra o resultado das últimas eleições presidenciais no Brasil estaria chacoalhando a imagem do nosso Brasil, ameaçando também as nossas exportações e mais ainda o nosso turismo. No Brasil, a UOL deu espaço a essas noticias, focando na França e num possível boicote de potenciais turistas franceses decepcionados, frustrados ou amedrontados pelas temáticas de campanha do Jair Bolsonaro. Várias ligações ou post nas redes sociais de amigos ou parentes preocupados com minha situação pessoal – como viver agora num país onde o exercito já estava nas ruas (!) e onde as liberdades mais fundamentais eram desrespeitadas (!) – me mostraram que as informações, reais ou fake, tinham de ser consideradas: a chegada de turistas estrangeiros poderão mesmo ser prejudicada?
Segurança é um critério chave para escolher ou não um destino de viagem
Se o fato de ser estrangeiro obriga a não opinar sobre os assuntos políticos brasileiros e a respeitar as escolhas democráticas, várias observações podem ser feitas a respeito do impacto para o turismo. A primeira é de lembrar que as decisões dos turistas ao escolherem as suas viagens internacionais dependem também de fatores objetivos, sendo para o Brasil especialmente a segurança e os custos do aéreo. Ainda é cedo para saber se o próximo governo conseguirá melhorar essa situação, mas parece que está extremamente preocupado em conseguir resultados, tanto em reduzir a criminalidade que pesa nas vendas do Rio de Janeiro e das capitais nordestinas, tanto nos preços dos vôos internacionais e domésticos que prejudicam o pais inteiro e mais ainda destinos turísticos mais remotos na Amazônia, no Centroeste ou no Sul.
Nos EEUU de Trump, o turismo já mostrou ser maior que a política
Refletir sobre politica e turismo é também olhar o impacto mútuo que já marcou outros destinos. É lembrar o sucesso do turismo internacional em países cujo cunhos democráticos já foram (com ou sem razão) discutidos, seja destinos lideres como a China, a Tailândia, a Turquia ou a Malásia, seja destinos tradicionais como Cuba, Marrocos, Egito ou Israel, seja destinos novos como Vietnã, Maldivas ou Irã. Mais interessantes é comparar as perspectivas brasileiras com as consequências sobre o turismo de votos populares na Inglaterra ou nos EE-UU. Na primeira, a decisão do Brexit em 2016 foi anunciada pela mídia européia como um desastre para o turismo local. Os números não concordaram, mostrando 4,3% de crescimento em 2017 e 4,4% em 2018. Nos Estados Unidos, teve um impacto negativo da eleição do Trump – somente 0,7% de crescimento em 2017-, mas se devia também a outros fatores como as restrições de vistos impostos a vários países, e as previsões para 2018 já superam 6%.
A alegria brasileira nas campanhas da Embratur
Mesmo limitadas nas suas consequências efetivas, as declarações de boicote das viagens para o Brasil não devem ser desprezadas, mas até levadas em consideração nas futuras campanhas de promoção internacionais que o setor espera do novo governo. Para sair do patamar limitado de 7 milhões de turistas – e chegar aos 10 ou até 15 milhões que suas riquezas naturais, culturais e humanas merecem, o Brasil deverá não somente convencer que as preocupações de insegurança e de carestia já pertencem ao passado, mas também mostrar que ele continua sendo o pais da alegria e da liberdade de viver, o pais onde cada visitante, qual que sejam suas origines ou suas opções pessoais, é mesmo recebido com um carinho único!
O casamento do Jacques Maurice, irmão da minha tataravó, com a Guianesa Elisa Guisolphe em 1895
Descobrir as suas raízes, sejam familiares, religiosas ou culturais, foi na História uma das primeiras motivações de viagem bem como uma fonte de prosperidade para muitos destinos, de Efeso a Jerusalém, de Atenas a Meca ou de Roma a Tehotiuacán. Desde a Antiguidade, essas cidades sabiam que o prestigio cultural, a potencia religiosa ou a pressão demográfica eram fatores que atraíam os visitantes. Nos últimos anos, com a forte tendência para dar as viagens um forte conteúdo enriquecedor ou até transformador, o turismo genealógico está atraindo viajantes a reencontrar as terras e as culturas dos seus ancestrais. Ele está crescendo, especialmente -mas não somente- nos países com uma longa historia de imigração, como na Oceania ou nas Américas, tanto para as populações de origem europeias como para aquelas cujos antepassados atravessaram os oceanos nos navios negreiros.
Casa do primeiro imigrante da família Tremblay em Randonnai (Normandia)
Um dos países onde esse turismo genealógico é o mais popular é o Canadá – Quebec. Os 7 milhões de descendentes dos 70.000 imigrantes que povoaram a “Nouvelle France” a partir de 1617 continuam a ter laços com seus vilarejos de origem. Incentivados pela Atout France que chegou até a montar um motor de pesquisa dando o local de origem de cada sobrenome do Quebec, milhares de viajantes vão assim procurar as suas raízes seguindo itinerários repletos de emoções. Na Normandia, no Poitou ou no Vale de Loire, prefeitos e profissionais de turismo de dezenas de pequenas cidades se mobilizam para receber esses primos da América, caminhar com eles nas ruas até encontrar a casa do primeiro imigrante, ou compartilhar com novos amigos e parentes distantes os pratos regionais, o vinho, e as tradições locais.
Uma família visitando a casa dos seus antepassados na Catalunha
Nos Estados Unidos muitas comunidades estão também se focando nessa procura de raízes. O turismo alemão foi talvez pioneiro, aproveitando as origens germânicas de 50 milhões de americanos para incentivar as buscas dos seus antepassados. Descobrindo numa pesquisa que 9% dos seus visitantes estavam querendo seguir os passos dos seus ancestrais, a Escócia colocou essa temática nas suas prioridades. Foi também o caso da Irlanda, dona de uma das mais fortes comunidades especialmente em Nova Iorque, Boston e Chicago, que juntou o turismo genealógico e a descoberta do patrimônio cultural nas suas promoções. A Espanha está interessada nos latinos que já representam quarenta milhões de pessoas com origens ibéricas, e a Sociedade catalã de genealogia está trabalhando em conjunto com o turismo espanhol, não somente nos Estados Unidos mas em todas as Américas.
Varias empresas oferecem ajudar para planificar uma viagem genealógica
Na onda do “turismo transformador”, uma viagem genealógica necessita um bom preparo, incluindo as vezes a ajuda de profissionais. No Quebec, a Sociedade genealógica dos canadenses franceses oferece um seminário aos viajantes interessados. Nos Estados Unidos Ancestry.com, maior empresa mundial de genealogia, tem várias propostas para responder aos pedidos dos seus associados, seja ajudando os viajantes individuais a preparar os seus roteiros, seja oferecendo circuitos acompanhados de um especialista – em cooperação com a operadora EF Go Ahead Tours ou com os cruzeiros da Cunard. Para os norte-americanos, o preparo da viagem pode até incluir a realização de teste DNA com empresas especializadas, 23andMe, AncestryDNA, ou o National Geographic tests d’ADN, bem como uma consulta na famosa Family History Library de Salt Lake City.
Sites estão ajudando a preparar as viagens genealógicas
Os destinos estão ajudando os viajantes a otimizar as suas pesquisas e seus encontros. O apoio pode ser através dos sites oficiais de turismo como Visit Scotland , o Turismo alemão o a Normandia, a Catalunha ou o Basilicata. Países com historias de emigração oferecem também acervos de museus especializados como o museu do Centro histórico das famílias irlandesas em Dublin na Irlanda, trabalham com agencias de viagens que oferecem roteiros personalizados, ou recomendam genealogistas como Tataranietos.com , empresa espanhola cujos clientes são em maioria latino-americanos, ou South Africa Genealogy. Mas para uma viagem tão impactante, serão as próprias pesquisas pessoais que assegurarão o sucesso: se informar sobre a historia da região, ter o máximo de nomes e dados dos parentes e ancestrais, saber quais foram os motivos que os levaram a deixar os seus lares.
Em Carghese, na Córsega, nos passos dos ancestrais gregos
O turismo genealógico pode levar a muitas viagens, cada uma seguindo as trilhas de um dos antepassados que terá sido identificado. Assim eu mesmo tive a chance de reencontrar, alem das minhas raízes na Combraille, os passos de um combatente grego radicado na Córsega, de um carbonaro napolitano exilado na Tunísia, de um revolucionário de Mainz seguidor de Napoleão, e de um engenheiro “auvergnat” desbravando as minas de ouro da Guiana. A historia de cada um foi sem dúvidas para mim um incrível enriquecimento pessoal e uma abertura maior para o mundo. Ajudando a saber de onde a gente vem, o turismo pode assim ajudar a saber para onde a gente vai!
Mexendo a cada lance com centenas de bilhões de USD, a guerra comercial que o Trump declarou para resto do mundo, e mais especialmente para China, está preocupando os profissionais do turismo dos Estados Unidos. A US Travel Association lembra que o setor teve nos últimos anos um forte crescimento, mas uma desaceleração começou em 2017 com a queda do turismo proveniente da América Latina e do Oriente Medio. As entradas aumentaram ainda de 0,7% em 2017 e os 77 milhões de visitantes internacionais gastaram um recorde de USD 251,4 bilhões, mas com somente 2% de alta em relação a 2016, longe da media de 8,9% dos anos Obama. A chave da expansão do turismo americano está agora no mercado chinês, responsável hoje por 3 milhões de entradas e mais de USD 35 bilhões de receitas, e com perspectivas de quase 5 milhões de entradas e de mais de USD 50 bilhões de receitas projetadas para 2023.
Entre os EEUU e a China, um confronto global pode impactar todos os setores
Mesmo se o NTTO (National Trade and Tourism Office) está esse ano com alguns problemas para publicar estatísticas confiáveis, varias pesquisas mostram tendência negativa em 2018. Um USD muito forte, a fraqueza da economia de vários países da América Latina -incluindo o México e o Brasil, bem como a desastrosa imagem do Presidente americano, seriam responsáveis de uma queda de quase 4% do numero de turistas e de USD 4,6 bilhões das receitas, bem como da perda de 40.000 empregos. E a guerra comercial sino-americana poderia piorar essas projeções. Desde março, o turismo chinês para os EEUU está em queda de 8,9%, e as reservas de grupos estão 34,4% abaixo dos números de 2017. Considerando os gastos elevados desses turistas ( uma media de USD 7000 por pessoa enquanto as outras nacionalidades não passam de USD 4400), uma pesquisa da Forwardkeys estima em USD 500 milhões o impacto da primeira batalha..
A guerra comercial vai prejudicar as metas de 5 milhões de turistas chineses em 2023
As novas taxas impostas essa semana sobre USD 200 bilhões de produtos chineses, e as retaliações de Pequim, vão ampliar a guerra comercial, e o impacto sobre o turismo pode ainda aumentar. Se é em principio descartado umas restrições explicitas sobre as viagens para os Estados Unidos, as autoridades chineses têm varias maneiras de provocar uma queda significava. Podem por exemplo ampliar os avisos negativos para os viajantes, assim que já fizeram em julho chamando atenção sobre a violência, a falta de segurança e até a sinofobia ameaçando os turistas chineses nas grandes cidades americanas. As mídias chineses podem até liberar a fibra nacionalista de uma população que ficou chocada pelas medidas de Trump e que pode muito bem desviar as suas preferências para outros destinos do Pacifico, da Ásia, da Europa ou da América Latina. A guerra somente está começando, mas os primeiros acontecimentos não são favoráveis para os profissionais do turismo dos Estados Unidos.
Esse artigo foi inspirado de um artigo de Serge Fabre na revista profissional on-line La Quotidienne
A França mais uma vez líder do turismo mundial em 2017
Mesmo publicadas com um pouco de atraso, as estatísticas 2017 do turismo francês são importantes para analisar a evolução do primeiro destino mundial. Com 86,9 milhões de entradas, a França continuou na liderança em entradas de turistas, na frente da Espanha (81,8 milhões, em expansão de 8,6% no conturbado mundo mediterrâneo) que passou na frente dos Estados Unidos (73,0 milhões, pagando talvez com uma queda de 3,8% a rigidez migratória do Trump). Com um crescimento de 5,1% foi não somente borrada a queda provocada pelos terríveis atentados de novembro 2015 e julho 2016, mas também ultrapassado o recorde anterior de 2015. Anunciando com muito orgulho esse resultado, o ministro das relações exteriores e do turismo confirmou que a França deveria atingir em 2020 a meta de 100 milhões de entradas e consolidar sua liderança.
Com alta de 47%, o turismo russo foi o que mais cresceu
Se esse bom resultado era esperado, os profissionais ficaram surpresos pelo desempenho dos mercados internacionais. Os esperados turistas asiáticos ainda não recuperaram os níveis de 2015, a China crescendo pouco (4,9%), a Índia ainda caindo (-5,6%), e somente o Japão tendo um crescimento forte (17,8%). Os americanos (5,6%) e mais ainda os brasileiros (17,9%) voltaram com toda força, mas foi da Europa que foram registrados os maiores fluxos com destaque para Rússia (43,4%), Espanha (17,3%), Bélgica (9,6%). Primeiro mercado europeu, o Reino Unido não pareceu sofrer do Brexit se consolidou na frente da Alemanha, chegando a 12,7 milhões de entradas e 6% de crescimento, uns números decisivos para oferecer a França o seu novo recorde de 2017.
EEUU lideram disparados o ranking das receitas do turismo internacional
O ranking do turismo mundial é porem bem diferente quando as receitas internacionais são o primeiro critério de classificação. A liderança disparada pertence nesse caso aos Estados Unidos com 190 bilhões de Euros, seguindo da Espanha com 60,3 bilhões. Mesmo tendo revisado os seus números e “re-encontrado” 10 bilhões de euros de receitas suplementares, a França fica somente em terceiro lugar com 54 bilhões de euros, uma posição ainda ameaçada pela China e pela Tailândia que poderiam subir no pódio já em 2018. Com a OMT projetando há 20 anos a chegada de 130 milhões de turistas na China em 2020, com os Estados Unidos e a Espanha num trend de forte crescimento, é certo que o título de pais mais visitado do mundo trocará de titular, e que ambas lideranças em receitas e em entradas de turistas internacionais serão então perdidas.
Na hora da sustentabilidade e da valorização do impacto econômico e social do turismo, os profissionais estranham a insistência dos políticos em se vangloriar de resultados quantitativos discutíveis. A França já se posiciona como um grande líder mundial do “melhor turismo” em vez do “mais turismo”, respondendo as expectativas tanto dos seus turistas que dos seus moradores. Numa concorrência mundializada, três fatores diferenciantes contribuem a uma nova liderança: a imagem de um acervo cultural mundialmente reconhecido, um bem viver autêntico e protegido, uma oferta temática completa, especialmente nos segmentos com mais valor agregado (luxo, gastronomia, bem estar, enologia, esqui, congressos ou grandes eventos.
Nos vilarejos da Provence, as mesas esperam turistas e moradores
Se o seu primeiro lugar em números de chegadas de turistas não vigorará alem dessa década, a França pode guardar sua liderança como destino de “melhor turismo” frente as novas tendências que estão se desenhando hoje. Pode continuar liderando pelo seu forte conteúdo cultural, seu patrimônio , seus museus, sua arquitetura, mas também pela alternativa que ele oferece ao modelo do concorrente norte americano. Pode liderar pela especificidade do seu arte de viver, o seu estilo de vida autentico compartilhado entre os viajantes internacionais, os turistas locais (mais de dois terços do turismo francês é domestico) e os moradores. Pode liderar pelas suas normas sempre rígidas, protegendo o consumidor em termos de sustentabilidade, de uso do espaço público, de alimentação ou de ética social.
O Mont Saint Michel, patrimônio e fé no monumento mais visitado fora de Paris
A França vai também guardar a sua liderança pela riqueza da sua oferta turística. Com uns 40 destinos internacionais, consegue oferecer uma excepcional diversidade que inclui produtos e serviços de excelência em quase todos os segmentos. A Pirámida do Louvre, o Palácio dos Festivais de Cannes, as pistas de Courchevel, o Mont Saint Michel, os bangalós de Bora Bora, os Hospices de Beaune, os vinhedos de Bordeaux, o bar do Lutetia, o Versailles do Ducasse, as adegas de Reims, os “bouchons”de Lyon, a vida de Saint Tropez, o castelo de Chenonceaux, o porto de Honfleur, o Hotel du Palais em Biarritz, ou as simples ruas e praças de Paris, Saint Paul de Vence, Saint Emilion ou Cap Ferret, são esses lugares de excelência, mais que números discutíveis, que ajudarão a França a liderar o turismo mundial.
Jean-Philippe Pérol
O porto de Honfleur, seduzindo os turistas pela sua luz e sua História
As viagens internacionais antecipando a retomada do crescimento brasileiro
Com um crescimento de 20% das viagens internacionais e de 50% das despesas no exterior durante o primeiro trimestre, os profissionais brasileiros do turismo estão hoje muito otimistas em relação a 2017. As projeções anuais variam de 5% até 20%, deixando quase certa uma recuperação dos clientes perdidos em 2016 e talvez até em 2015, especialmente junto aos novos viajantes de lazer. Os “emergentes” estão de novo transformando o Brasil numa grande potência turística internacional, empurrando o crescimento das vendas das operadoras, com taxa de dois e as vezes de três dígitos.
A nova campanha bem sucedida de Paris para atrair os visitantes
Castigada durante dois anos seguintes, a França está voltando a ser o destino favorito dos brasileiros na Europa, com um crescimento de 25,6% de janeiro a março, e umas perspectivas de quase 50% nos próximos seis meses. Alem de recuperação de demanda reprimida, esses resultados se devem aos esforços dos profissionais e das autoridades no atendimento, na segurança e nos preços, bem como ao cambio favorável ao euro e as facilidades de viagem – fatores que impactam de forma negativo o grande concorrente americano.
O otimismo dos franceses em relação as chegadas de turistas brasileiros é agora reforçado com os novos rumos da política da França. Um Presidente jovem, trazendo ideias de abertura ao mundo, de respeito as diversidades culturais e de orgulho de pertencer a um pais acolhedor, deve ajudar os turistas do mundo inteiro a escolher nosso pais . O turismo parece também ser uma das prioridades do novo Presidente, e os profissionais notaram com muita satisfação que o primeiro compromisso oficial que ele assumiu domingo foi de receber o Comité Olímpico Internacional para empurrar a candidatura de Paris para os Jogos 2024.
O Airbus 380, uma das opção para aumentar a oferta de assentos no Brasil
Para esse otimismo ser confirmado com números, o turismo brasileiro precisa agora de confiança. Confiança dos viajantes na retomada, mesmo gradual, da economia bem como na estabilidade do cambio. Confiança também dos profissionais que o setor está mesmo voltando a crescer. Dois gargalos só poderão ser resolvidos com essa confiança. O primeiro é a oferta de voos internacionais que caiu de 25% esse ano, o Brasil tendo menos voos, menos assentos e menos gateways internacionais. Agora com somente 5 voos diários, Paris é um dos destinos onde a situação ficou mais critica. Com saudade de ligações regulares para Brasília, Recife, Salvador ou Manaus, temos que esperar a ampliação de numero de assentos prevista pela Air France e torcer para ver a LATAM – ou uma outra companhia brasileira- voltar a por a mesma confiança no destino França que a saudosa VARIG.
A Travel week, encontro mor dos profissionais do turismo de luxo
A confiança é também necessária para ver os profissionais estrangeiros voltar a investir em promoção no mercado brasileiro. Os últimos eventos do trade – WTM bem como Travel Week- mostraram queda de 20% e mais nas participação de expositores internacionais, sejam as companhias aéreas, os destinos, os receptivos ou os hotéis. A retomada do mercado só poderá ser definitiva se esses incontornáveis parceiros voltam a investir no Brasil, adaptando os seus serviços e as suas ofertas, e, mais ainda, investindo em ações de promoção. A nos, profissionais brasileiros, o dever de repassar essa confiança, e a convicção que o Brasil continua de ser um dos maiores mercados emergentes do mundo global.
O Trump Presidente poderia prejudicar o Trump hoteleiro
Talvez por ter acontecido no fechamento do WTM de Londres, encontro-mor do turismo mundial, o resultado das eleições americanas foi também nos últimos dias o grande assunto das conversas dos profissionais. Uma pesquisa feita nos corredores do Salão tinha revelada que só 7% do trade internacional apoiava o excêntrico bilionário, e que os outros o julgava misógino , racista, sem experiência política, vulgar, e intelectualmente vazio. Agora que Trump foi eleito, e sabendo que nenhum responsável do turismo esperava esse resultado, a grande pergunta é de saber até onde essa vitoria poderá impactar os fluxos turísticos internacionais!
O WTM de Londres, grande encontro do turismo mundial
Se Trump cumpre as suas promessas de campanha, deve reforçar os controles sobre a entrada dos franceses e dos alemães, exigir passaporte biométrico para qualquer isenção de visto, construir um muro para impedir as entradas de mexicanos, controlar de forma estrita os brasileiros, desconfiar dos chineses, e proibir as entradas de qualquer muçulmano. Num total de 78 milhões de turistas entrando nos Estados Unidos, mais da metade seriam assim submetidos a algum tipo de constrangimento. E cinco dos de maiores mercados emissores para os Estados Unidos são na lista negra do magnata. Segundo o relatório anual da WTM, o resultado das eleições americanas pode assim ter grandes consequências sobre o turismo mundial.
Os danos das declarações do candidato – e as prováveis decisões do Presidente – podem ser catastróficas para a imagem dos Estados Unidos nos grandes mercados emissores, os novos valores não correspondendo mais com os ideais que os visitantes estão procurando. Temida pelos responsáveis de Visit USA ou de Brand USA, esse risco já está virando realidade. Uma pesquisa da Travelzoo mostrou que 20% dos britânicos estão descartando viajar agora para os Estados Unidos, e a maioria pensa que o turismo americano vai ser prejudicado. Paradoxo surpreendente, o empresário Trump será mais prejudicado ainda pela queda da imagem dos Estados Unidos, a metade dos clientes das agencias de viagens inglesas declaram não querer mais se hospedar nos hotéis do magnata.
O turismo canadense aproveitando o novo cenário?
Enquanto o turismo mundial continuará a crescer nos próximos anos, as possíveis dificuldades dos Estados Unidos poderão ser aproveitadas por alguns dos seus concorrentes. É o caso do Canada que constatou nos últimos dias, das Províncias Marítimas até Montréal e Vancouver, um boom das reservas vindo não somente da Inglaterra e da Europa, mas também dos próprios Estados Unidos. No Brasil, se o cambio ajudar e o Dolar se fortalecendo frente ao Euro, a Europa poderia ser a grande favorecida. É so relembrar o impacto do saudoso Bush sobre as viagens internacionais. Durante as suas presidências, o numero de brasileiros indo para os Estados Unidos perdeu a liderança, passando de 740.000 entradas a 770.000, enquanto as viagens para Europa tinham cresceram de 600.000 a mais de 1.000.000. O ranking se inverteu de novo em 2015, 2,2 milhões contra 1,8 milhões, pelo carisma do Obama. Em 2018, o Canadá, a França, o Portugal ou a Itália terão talvez de agradecer o Donald.
Jean-Philippe Pérol
Em Paris, a opção de juntar a Torre Eiffel e a estátua da Liberdade!
Os clichês britânicos mais procurados depois do Brexit
Se os políticos e os economistas do mundo inteiro foram muito negativos sobre as consequências do Brexit, os turistas internacionais parecem ter aprovado a decisão dos ingleses. Aproveitando uma queda da libra de quase 10% – a moeda atingiu seu nível mais baixo dos últimos 30 anos-, as entradas de turistas subiram de 4,3% em julho. Se as chegadas da Europa ainda são fracas (em recuo de 1,8% mas caiam de 6,8% antes do plebiscito) , a alta é puxada pelos os chineses, os americanos, os canadenses e a maior parte dos não-europeus que crescem de 8,6%. E se ainda é cedo para desenhar tendências a longo prazo, a alta deve se prolongar nos próximos meses: as reservas da International Net bookings, que eram em queda de 2,8% em maio, estão agora também em alta de 4,3%.
Turista americano em Londres
Os americanos são há muito tempo os mais numerosos turistas internacionais na Inglaterra. Foram 3,3 milhões em 2015, um crescimento de 10% em relação a 2014, e, segundo Visit Britain – a agencia nacional de promoção do turismo, vários indicadores mostram que a popularidade do pais cresceu depois do Brexit. Os números estão bastante impressionante na Internet: 38% de visitantes a mais no próprio site da VisitBritain, mas também 138% a mais nas pesquisas no site da British Airways nos Estados Unidos, 30% a mais no site e nas vendas da Expedia. Os hoteleiros ingleses confirmam um crescimento das reservas, especialmente os “last minut bookings”.
O distrito financeiro da City
A fraqueza da libra depois do Brexit é dada pelos profissionais como a primeira razão desse crescimento surpreendente. Num destino visto há anos como muito caro, ela não somente impulsionou as reservas internacionais, mas impactou também as viagens dos próprios britânicos. Com um poder aquisitivo diminuído e já impactando os destinos ligados ao dólar, eles estão aumentando sua procura de viagens domésticos, e a Airbnb já anunciou que a procura de apartamentos no mercado inglês subiu de 122% desde o plebiscito. Essa tendência favorecendo as “staycations” está sendo observada também pela Expedia.
Abbey Road, um dos imperdíveis clichês
O maior impacto do Brexit sobre o turismo na Grã Bretanha deverá porem se medir em termo de imagem. Em primeiro lugar pelo reposicionamento em termo de preços que os hoteleiros já perceberam e ampliaram com uma seria de iniciativas para dar aos visitantes “more value for money”, oferecendo up-grades, diárias de cortesia ou serviços complementares. A libra barata reforça a atratividade da marca, e deve aumentar ainda mais sua força nas clientelas mais jovens e nos mercados emergentes. Mas o maior impulso dado a imagem do pais será de mostrar a sua diferencia. Enquanto os destinos turísticos devem cada vez mostrar uma identidade forte e um conteúdo que justifica a escolha de viajantes internacionais cada vez mais experientes, o novo posicionamento britânico vai ser uma extraordinária oportunidade. Frente a uma Europa aonde a “harmonização” poderia levar a uma banalização, a Grã Bretanha poderá atrair ainda mais pelo sua peculiaridade. Para os destinos turísticos, é importante lembrar que “Vive la différence”.
Jean Philippe Pérol
Entre a Europa e o mar aberto, a Grã Bretanha sempre deverá escolher o mar aberto