A Air France voltando a ligar as Amazônias brasileira e francesa

Depois de 37 anos, Belém voltando nas rotas da Air France

Reforçando a sua malha regional no Caribe, a Air France vai reabrir a partir de 5 de maio de 2023 um voo direto entre Belém e Caiena (Guiana Francesa), atualmente abandonado pela Azul. O voo será semanal, operado com um Airbus A320 equipado com Wi-Fi. Ele seguirá sem precisar de conexão  para Fort-de-France (Martinica), e depois para Pointe-à-Pitre (Guadalupe), reconectando diretamente o Caribe francês com o Brasil.  Os horários foram também escolhidos para oferecer aos viajantes da região norte mais uma possibilidade de viajar para França, com uma conexão para Paris-Orly.

Air France voltando para a Amazônia

Muito sazonal, devido ao fraco intercâmbio econômico e turístico, essa rota sempre foi difícil e, em trinta anos, oito companhias se sucederam entre os aeroportos de Val-de-Cans (Belem)  e de Felix Eboué (Caiena). Os mais velhos se lembram da Cruzeiro do Sul, da TABA, da VARIG, da Penta, da TAF, da Suriname Airways e da Air Caraïbes, além, claro, da própria Air France que já explorou esse voo de 1984 a 1986. E para quem viveu a febre de desenvolvimento da Amazônia nos anos 1970, essa volta da Air France não pode deixar de relembrar a emocionante abertura do voo Manaus Caiena Paris, um inesquecível pouso de um B747 o dia 31 de março  de1977 (era programado para ser dia 1 de abril, mas as autoridades aeronáuticas da época pediram adiantar de um dia para coincidir com o aniversário dos eventos de 1964).

A ponte unindo as duas margens do Rio Oiapoque

Se a história mostra que a ligação aérea entre as duas margens do Oiapoque foi sempre muito aleatória, existem pelo menos três razões de pensar que a Air France pode agora sem bem sucedida: a primeira é que a nova conjuntura política facilitou a volta do Brasil nas agendas dos principais líderes políticos, e as grandes mídias francesas, europeias e norte americanas estão apoiando novas iniciativas de intercâmbio. Essa tendencia se traduz também a níveis regionais, com os países das Guianas e do Caribe muito interessados em multiplicar as relações culturais e econômicas. Do lado francês, a Martinica, a Guadalupe e a própria Guiana já mostraram ser surpreendentes mercados emissores para o Brasil, além de parceiros interessados pela cooperação regional.

O voo deve relançar a cooperação inter-regional, Guiana no Amapá, ou Martinica no Pará

Mas as maiores perspectivas são mesmo amazônicas. A Guiana francesa é também a Amazônia francesa, cobrindo menos de 2% da imensa bacia do Rio Mar, 30 vezes menos que o lado brasileiro, mas o suficiente para ser parte do pequeno e exclusivo grupo de 9 países que devem definir o futuro dessa região tão cobiçada pelas outras grandes potências. Concentrando as atenções pelo impacto do seu necessário desenvolvimento sobre o aquecimento global, a Amazônia vai, sem dúvida, ver nos próximos anos uma aceleração dos investimentos internacionais, dos intercâmbios culturais e das chegadas de turistas. Para Air France, umas oportunidades  para continuar a acompanhar e até a escrever paginas da História desta fascinante Amazônia onde a França tem sua mais extensa fronteira internacional.

 

Jean-Philippe Pérol

 

Horarios dos voos da Air france (até o dia 31 de Outubro):

AF603:  saída de Belém nos sábados as 09:35, chegando em  Caiena aa 11:10

AF602: saída de Caiena nas sexta-feiras as 15:40, chegando em Belém as 17:15

Além do Oiapoque, as tartarugas de couro atraiam científicos e turistas

Tartaruga de couro pondo na praia de Awala-Yalimapo

Além do Oiapoque, nas praias de Caiena, de Remire-Montjoly ou da reserva natural de Amana, sombras gigantes saiam das ondas do mar e subam na areia.  De abril até agosto,  as tartarugas de couro andam com dificuldades para procurar o melhor lugar para por seus ovos. Com suas nadadeiras traseiras, ela cava a areia até o buraco ter a profundidade certa. Começa então um esforço intenso, no ritmo de uma respiração forte, para expulsar e depois enterrar uma centena de ovos. Exausta, a tartaruga de mais de meia tonelada vai então fazer três vezes a volta do seu ninho antes de de arrastar até as águas do oceano.

Tortue Luth © Anaele Sacchettini

A tartaruga volta para a água depois de por

Parte francesa da Amazônia, a Guiana é considerada um dos mais importantes lares de três tartarugas marinhas muito emblemáticas mas muito ameaçadas: a tartaruga olivácea, a tartaruga verde (ou aruanã) e a tartaruga de couro. Também chamada de tartaruga luth, essa última é um gigante do mar, o maior reptil depois dos crocodilos, o macho podendo medir até dois metros e meio e pesar mais de 900 quilos. Capazes de percorrer milhares de quilômetros no mar para se alimentar de medusas e águas-vivas, elas tem pontos de desovas tanto no Pacifico (Australia, Malásia e Costa Rica) que no Atlantico (Flórida, Africa, Caribe e mesmo nas margens da Foz do Rio Doce no Espírito Santo).

A corrida para o mar depois da eclosão é outro momento emocionante

O litoral da Guiana Francesa é porem o lugar privilegiado onde as fêmeas voltam para fazer seus ninhos, com até 18.000 desovas em 2018, principalmente nos cinco quilômetros da praia de Awala-Yalimapo, perto da foz do Rio Maroni e da fronteira com o Surinam. Desde os anos setenta, a importância destes sítios levou os científicos a chamar a atenção sobre a necessidade de uma politica de preservação frente as fortes ameaças de extinção que pesam sobre as tartarugas marinhas da Guiana, seja pelo recuo do litoral, pela caça descontrolada, e pelas perturbações animais ou humanas durante os momentos cruciais da desova e da eclosão dos ovos. 

A desova das tartarugas de couro atrai agora centenas de turistas, com um impacto importante sobre a economia e os empregos da região. Frente ao riscos ecológicos, a Rede tartarugas marinhas da Guiana coordena  os quarenta principais atores da fileira trabalhando seja nos projetos científicos de conservação seja no acompanhamento dos turistas. Na reserva natural de Amana os guardas da reserva organizam visitas em grupos, ensinando os bons comportamentos para viver essa experiência excepcional sem perturbar os animais. Voluntários da associação Kwata organizam também durante a temporada animações e conferencias de sensibilização para os mais jovens.

                                                         

 

Novidades no turismo alem do Oiapoque

As Ilhas da Salvação, ponto turístico imprescindível da Guiana francesa

As Ilhas da Salvação, ponto turístico imprescindível da Guiana francesa

Com novos voos da Azul entre Belém e Caiena, com a abertura (prevista agora em setembro) da ponte sobre o Rio Oiapoque, e com a facilitação dos vistos, os profissionais da Guiana francesa estão acreditando que o turismo entre os dois países deve entrar numa nova fase de desenvolvimento. Dono da mas importante empresa de receptivo da região, a JAL Voyages,  Jean-Louis Antoine acredita que as inovações tecnológicas e os novos produtos turísticos sustentáveis vão criar oportunidades para o turismo amazônico

Eco-lodge da JAL nos pântanos de Kaw

Eco-lodge da JAL nos pântanos de Kaw

Quais são as novidades do turismo na Guiana francesa ?

A região amazônica tem um forte potencial de produtos originais que não podem ser encontrados em outros lugares. São por exemplo os eco-lodges flutuantes ou as hospedagens na canopeia, ou projetos de pequenos barcos movidos a energia solar, com motores elétricos ideais para não poluir e aproveitar a natureza. Os viajantes querem emoção, querem experiências autenticas, podendo mergulhar nas culturas locais . O papel dos guias, em geral índios ou caboclos, é fundamental para valorizar cada descoberta, seja de uma arvore, de um animal ou de uma paisagem. As excursões propostas agradem os turistas, mas o potencial é muito grande, muito alem dos 200.000 visitantes que a Guiana francesa recebe cada ano.

As cataratas Voltaire

As cataratas Voltaire

Quais são os freios ao crescimento?

O turismo sendo uma atividade transversal, os maiores problemas são as dificuldades de coordenação entre todos os envolvidos. As administrações são competentes e querem ajudar, mas são divididas entre os níveis federal, estadual e municipal, cada um com suas orientações, cada um com seu ritmo, e sem coordenação. Assim as coisas podem andar de um lado  e bloquear no outro. ob_72fbbe_fabius-et-jl-antoineResolvem os problemas de vistos – inclusive para os brasileiros-, mas parem na legislação do setor imobiliário ou na insuficiência de capacidade hoteleira. Dentre dos maiores problemas ainda não resolvidos, destaque-se hoje as exigências de vacinas contra a febre amarela bem como as preocupações dos americanos e dos europeus com a zika. A situação é controlado, mas os clientes são muito relutantes para se vacinar, mesmo si as exigências são impostas pela Organização mundial da saúde para todos os países da região . As pesquisas mostram mesmo que 30% deles desistam da viagem, mais ainda quando são famílias com crianças.

A ponte sobre o Rio Oiapoque

A ponte sobre o Rio Oiapoque

Qual é a primeira urgência para um desenvolvimento turístico sustentável?

A grande prioridade é a capacitação profissional. O turismo pode virar na região amazônica o primeiro empregador, direto ou indireto. Tem que ampliar as vagas nos centros de formação hoteleira ou culinária, ou nos centros de artesanato . A formação de guias –  hoje vinte pessoas por ano que recebem um diploma de qualificação em meio-ambiente amazônico – é essencial, não somente para melhorar a experiência do turista, mas também para atrair para o turismo as populações locais e valorizar os seus conhecimentos do meio ambiente natural e do acervo cultural da Guiana. Inovar na Amazônia é não somente uma necessidade tecnológica, mas também um investimento humano.

 

Esse artigo foi traduzido e adaptado de um artigo de Bertrand Figuier na revista profissional on-line La Quotidienne

Trilhas na mata da Guiana

Trilhas na mata da Guiana francesa

A França, do Oiapoque ao Maroni!

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O Brasil, do Oiapoque ao Chuí, isso tudo mundo sabe. Mas além do Oiapoque? Isso, poucos sabem, pelo menos poucos franceses. Là começa a França ou mais exatamente uma região francesa, a Guiana, que se estica da fronteira Brasileira até a beira do Rio Maroni.

Explorada no século 17 pelo mesmo Daniel de la Touche que fundou São Luiz do Maranhao, a Guiana teve uma historia difícil. Uma longa disputa territorial com o Brasil (que ocupou a região durante as guerras com Napoleão)  so acabou com a arbitragem do Presidente da Suíça em 1900, por sinal 100% a favor do Brasil. Imagem1Arruinada pela saída dos jesuítas, a economia foi marcada pelas desumanas condições de trabalho, primeiro da mão de obra escrava e depois dos condenados ao famoso ‘bagne’. Uma corrida para o ouro no final do século 19 trouxe um surto de riqueza e novos imigrantes (junto com um tio-bisavô meu), mas o ouro quase acabou até que garimpeiros brasileiros – hoje quase 3000 – se interessassem de novo pelas jazidas esparsas no meio da selva. São muitas historias que foram escritas em comum com o Brasil, desde o roubo do primeiro cafeeiro pelo amante brasileiro da bela governadora até as aventuras da Saraminda tão bem contadas pelo Sarney no seu livro sobre o Contestado.

A uma hora de avião de Belém, IMG00252-20110905-1613ou seis horas de Macapá pela estrada, a Guiana pode ser uma opção para turistas querendo descobrir uma Amazônia diferente, onde os supermercados tem mais ‘camembert’ que açaí, os bares mais Bordeaux que cachaça, onde se anda mais de carro que de canoa e onde os restaurantes oferecem tanto carne de jacaré do que ‘filet au poivre’. Por sinal o melhor restaurante da região é o Paris Cayenne cujo chefe consegue com muitíssimo talento misturar ingredientes e ideias vindo da França metropolitana, da Amazônia e do Brasil.

Uma estadia nesse além-Oiapoque tem que começar no Bar des Palmistes, o mais tradicional de Caiena, num prédio tombado e muito bem renovado, de frente para uma linda praça plantada de palmeiras imperiais. L1040067Nos arredores, vale andar no Mercado municipal onde se fala tanto francês que creole, taki-taki ou (mais ainda) português. Casas e sobrados coloridos da época colonial  dividam as ruas principais com lojas de perfumes ou de jóias de ouro (passar no Jan d’Or, um pequeno artesão creativo e simpático). Se a cidade vale pelo charme do ambiente tropical e francês, o turismo na Guiana tem alguns imperdíveis.

DSCN1284Em primeiro as Iles du Salut, em frente da cidade de Kourou. As três ilhas são famosas porque foram um dos presídios mas duro da Guiana. Na maior, a Ilha Real, ficava o governador e os presos comuns. Sobrou muitos prédios, incluindo os mais importantes onde fica o restaurante e   um pequeno mas simpático hotel onde vale a pena ficar uma noite. Na segunda ilha, São José, ficavam os presos mais perigosos, em condições terríveis ainda visíveis nas ruínas das células a céu aberto. Enfim, na terceira, a Ilha do Diabo, ficavam os presos políticos cujo  mais famoso foi o injustiçado Capitao Dreyfus. IMG-20120705-00504A cidade de Kourou é famosa pela base de lançamento de foguete (que tem por sinal cooperação com Alcântara e Barreira do Inferno no Brasil). Se tiver sorte, pode ter a chance de ver um lançamento de Ariane, Soyouz ou Veja, os três tipos de foguetes lançados quase mensalmente.

Na beira do Rio Maroni, fronteira com o Suriname, Saint Laurent é a segunda cidade da Guiana, e guarda um impressionante acervo da época dos presídios, incluindo o famoso Camp e la Transportation por onde transitou Papillon…DSCN3931 Se hospedando aqui, na Tentiaire, dá para uma interessante excursão pelo rio até a cidade de Apatou, famosa pelas artes quilombolas. E se for là entre  maio e setembro, ai não perca o fabuloso espetáculos das tartarugas de couro pondo na praia de Awala.

Genuinamente amazônica, a Guiana oferece ao turista muitas belezas, muitas atividades e muitas tradições conhecidas também no Norte do Brasil:DSCN30014 banhos em igarapés de agua fresca (experimente Iracubo ou as cataratas de Montmorency), praias (a melhor é do Novotel em Caiena), passeios em trilhas de selva (o Morro dos Macacos não demora duas horas e da uma vista linda sobre Kourou),  focagem de jacarés em Kaw (excursões organizadas pela JAL voyages), bird watching de guarás, ou pesca esportiva nas ilhas para quem gostar de tarpão ou acupá. Não tem boi bumba mas tem um carnaval muito animado e uma tradição muito divertida. Nos maiores bailes da Guiana, as mulheres chegam vestidas de damas do século 18. Elas tem a cara, as mãos e o corpo totalmente escondidos com mascara, luvas, e meias. São as tululús que tem o privilegio de escolher os seus cavalheiros, esses sendo obrigados de aceitar sem saber qual é a mulher que se esconde atrás da mascara. Cuidado que pode até ser a sua! Ainda bem que isso, só além do Oiapoque.

Touloulous

Jean-Philippe Pérol