Talvez sem perceber, a American Express Global Business Travel encerrou a semana passada uma das maiores páginas da história das viagens e do turismo internacional. Por US$ 570 milhões, comprou a CWT, ex- Carlson Wagons lits, última herdeira da “Compagnie Internationale des Wagons lits et des Grands Express européens”que tinha sido fundada no dia 4 de dezembro de 1876 pelo empresario belgo Georges Nagelmackers. Com suas horas de gloria, nos trens de luxo com o Orient Express, nas agencias de viagens que chegaram no Brasil em 1935 com a Wagons lits // Cook, ou nos hotéis que foram integrados pela Accor em 1991, a empresa quase sesquicentenária foi assim absorvida pelo seu primeiro concorrente.
Com essa compra, a maior ja registrada no setor das chamadas TMC (travel management companies), Amex GBT vai adquirir uma carteira de 4000 clientes, e aumentar seu faturamento global de 45%, projetando para 2024 atingir um total de US$ 45 bilhões. Já planejando significativas economias com valiosas sinergias, Paul Abbott, CEO da empresa, previu que as receitas devem aproximar os US$ 2,5 bilhões e que o valor das ações deve ser impactado positivamente logo no primeiro ano. Amex GBT consolidará assim sua posição no setor de viagens e turismo. Já primeira na Europa e terceira mundial atrás da Booking e de Expedia, ela se reforcará com as posições da CWT, hoje terceiro lugar na Europa e quinto a nível mundial.
No seu comunicado, Abbott insistiu nos valores agregados que a antiga Compagnie Internationale des Wagons lits ia trazer na fusão, destacando sua força junta as medias e pequenas empresas, seu posicionamento em setores chaves como energia, comunicação ou esportes. Suas parcerias inovadoras, seja com Booking, seja com integração da Inteligência Artificial são também fontes de novas oportunidades. O acordo, que vai deixar os antigos acionistas da CWT com 13% das ações do grupo, dependendo ainda do acordo das autoridades reguladores que ainda podem solicitar mudanças ou até vetar clausulas que poderiam ser julgadas contrárias a concorrência.
Os especialistas não são convencidos do sucesso a medio ou longo prazo dessa operação, vendo pelo menos três obstáculos importantes. Primeiro, as duas empresas não são em boa saude financeira – a CWT teve que passar pelo doloroso “Chapter 11”. Segundo, o futuro pos-Covid do Corporate Business, hoje sustendo pela alta dos preços da aviação e da hotelaria, ainda deverão enfrentar as modificações de comportamento do teletrabalho e as consequentes reduções das viagens (estimadas 20% em varios estudos na Europa e nos Estados Unidos). Enfim a fusão pode não ser tão bem percebida tanto pelos fornecedores – hoje apostando cada vez mais nas vendas diretas- que pelos clientes que podem se atraídos pelos concorrentes.
Para todos aqueles que ajudaram a escrever a historia da Wagons lits, esse final é um momento de muita emoção. No Brasil, a empresa abriu em 1935 com um decreto assinado pelo próprio Getulio, foi uma das duas agências que conseguiu se manter em Sao Paulo durante a Segunda Guerra, foi fundadora da ABAV em 1953, superou em 1976 o divorcio com a Thomas Cook, e chegou em 1984 a ter o sexto maior faturamento do setor, com 13 agencias e duas operadoras em 8 estados do pais. Nos anos 90, a grande virada para as viagens corporate se acelerou com a chegada da Carlson, uma nova aventura da “velha dama dos carros leito” que acabou nesta compra pela Amex GBT. Para o autor deste blog, que participou com milhares de colegas desta aventura no Brasil e na Franca, ficou um pouco de tristeza e muita saudade dos anos glamour da Compagnie Internationale des Wagons lits et du tourisme.
Jean-Philippe Pérol
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